Meus amigos, este conto
foi escrito por uma querida amiga, cuja generosidade e boa vontade
para comigo fizeram com que não apenas apreciasse o meu "Até
que Alguém Reconheça", como também mergulhasse na história
para nos contar quem foi ou pode ter sido, a heroína daquela
história. O texto de Francisca nos brinda com um verdadeiro mix de
emoções, que só quem é dotado da sensibilidade e talento da
autora seria capaz. Como gostei muito (e, Ok, Ok, por um pouquinho de
vaidade, já que me foi dedicado), pedi autorização para dividir
com vocês nesse blog. Aproveitem!
BRUMAS E NEBLINAS
(Francisca Lacerda)
Para meu amigo Ney
Pimenta
Manchetes dos jornais
do dia – Neblina fecha aeroporto em Curitiba.
Li aquele título e
lembrei-me das vezes em que não só aeroportos são fechados por
neblinas: as mentes também se fecham em mistérios e sombras. Que o
diga o Alienista, de Machado de Assis.
Isso é tão verdade
que uma bruma esfumaça meus dias. Quero cantar, quero rezar, quero
ouvir, quero dialogar, mas não consigo. Isso desde o dia em que cai
de um sonho esquisito, direto no quintal de uma grande casa e
deparei-me com um enorme cachorro que rosnava ameaçador. Parece que
se quebrou alguma coisa dentro de mim. É como se eu fosse uma
máquina e um parafuso estivesse solto. É isso – sou como o
autômato quebrado de Hugo Cabret.
Até meu nome esqueci.
Penso que me chamo
Valentina, porque, no sonho, alguém dizia: Cuidado, Valentina.
Interessante... A voz
era do Jonas, meu querido Jonas. Mas por que não me chamou de mamãe,
como era seu costume?
Às vezes, tenho
visões. E elas são recorrentes. Vejo uma mulher de porte elegante,
cabelos alinhados num coque à antiga, vestida com roupas surradas,
mas limpas e ainda bonitas. E essa mulher, em meus devaneios, sai
pela rua recitando poemas alheios, esperando tranquilamente que
alguém os reconheça e a ajude a declamá-los. Ainda outro dia, vi
diversas pessoas intrigadas com o fato, e outras até felizes,
compartilhando poemas com a elegante mulher, que mal acabava um
começava outro, e sorria um sorriso de Monalisa.
Nos meus momentos de
lucidez, como hoje, fico a pensar se seria eu essa mulher. Não sou
tão elegante, mas sou magra como manda a moda atual, não tenho
roupas bonitas, mas em sonhos, por que não? E eu bem que gostaria de
ser poeta... Quando estudante de Letras, até que me saía bem e
minhas amigas gostavam dos meus escritos. Até Irmã Theresa falava
para eu escrever mais (ai, meu Deus, quem seria essa Irmã Theresa...
e por que esse nome, agora?). Eu gostava de música também. Cheguei
a tocar um pouco de violão e piano. Nem sei por que não sei nada
mais.
Mas se fosse eu a
mulher enigmática, ou seja, se ela fosse real, eu teria que ser
duas. Porque eu vi essa mulher. Juro que a vi. Não pode ser apenas
um devaneio. O pior é que já li um conto de um amigo que falava
sobre uma mulher assim. Seria ficção? Isso é mais um quebra-cabeça
a me atormentar.
Meu Jonas partiu para o
infinito há tanto tempo...
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